A imprensa não está nem aí para o desaparecimento da professora de Pelotas

23 de novembro de 2019
Autor: Carlos Wagner

Carlos Wagner

Jornalista

Podem apostar. Não vai ser a truculência do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), que irá nocautear o bom jornalismo brasileiro. Mas será quando o leitor deixar de bater nas portas das redações em busca de alguém que ouça e denuncie os seus problemas. As autoridades só levam as coisas a sério quando elas aparecem nas manchetes dos noticiários. Mesmo em tempo de redes sociais ainda são os noticiários que chutam as portas das autoridades. Tanto que elas gastam milhões espalhando fake news para tentar nos desmoralizar.

E nada é mais cruel que a omissão da imprensa nos casos de pessoas desaparecidas que se tornam uma agonia para as famílias, os amigos e a sociedade de um modo geral. Como é o caso da professora Cláudia Hartleben, 47 anos, do curso de Biotecnologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). O ex-marido e o filho da professora chegaram a ser apontados como suspeitos pela investigação policial. Mas a Justiça não aceitou a denúncia. O caso segue sem solução. Ela desapareceu na noite de 9 de abril de 2015, ou seja: quatro anos, dois meses e alguns dias. Se perguntar para algum membro da família, ele dirá as horas e até os minutos em que Cláudia é procurada, viva ou morta.

A professora não é única desaparecida no território gaúcho. Há outros casos que mencionei na postagem Procurados Vivos ou Mortos, de 4 de setembro de 2018. Um caso já foi resolvido: o corpo da contadora Sandra Mara Lovis Trentin, 49 anos, que sumira em janeiro de 2018, em Palmeira das Missões, no norte do Estado, foi encontrado ao acaso por um agricultor às margens da BR-153 (entre Palmeira e Panambi). A história que a autópsia do corpo contou colocou na cadeia o marido da contadora, o vereador Paulo Landf (PSDB), de Boa Vista das Missões, pequena cidade à beira da BR-386, onde vive a família da vítima. Landf contratou o jovem Ismael Bonetto para sequestrar e matar Sandra. Os dois estão presos aguardando julgamento. O que há de diferente no caso da professora de Pelotas? Ela é funcionária federal, e isso abre a possibilidade de que a Polícia Federal (PF) entre no caso. O atual governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), foi prefeito em Pelotas (2013 a 2017), portanto conhece a história.

O caso da professora Cláudia e dos outros desaparecidos e procurados vivos ou mortos caíram no que chamamos nas redações de “pé da página” – vez ou outra aparece uma pequena notícia. Essa situação não nasceu hoje. Ela vem de longe. Mas agora houve uma virada de mesa. Os assinantes e os anunciantes estão desaparecendo da grande imprensa por terem encontrado opções mais eficientes e baratas para se informar. Restou para os jornais focar seus conteúdos em denúncias relevantes, tipo o descaso com o desaparecimento da professora de Pelotas. Vem a pergunta: por que a Polícia Civil precisa ser pressionada para trabalhar? Ela tem tantos casos para resolver que tudo que não é solucionando na primeira semana é jogado na vale comum das delegacias, numa gaveta de uma mesa qualquer. Aqui chegamos ao xis da história. Olha, é do jogo a grande imprensa de Porto Alegre virar as costas para o caso. Mas não os noticiários de Pelotas. E aqui eu quero falar com os meus colegas repórteres, principalmente os jovens que cursam jornalismo em Pelotas. A história da professora Cláudia não pode ser esquecida.

E como fazer para que a história não seja esquecida? Montem sites, blogues e outros meios de comunicação. Mostrar-se relevante para os leitores é uma boa maneira de começar na profissão. Sempre digo uma coisa: jornalistas são formados pelas faculdades, repórteres pela lida diária na busca de histórias para contar. O caso da professora é uma boa oportunidade de praticar o bom jornalismo. É simples assim.