Na verdade foi o México que se classificou!


Enquanto se desenrola a Copa do Mundo na Rússia, o México protagonizou dois fatos que nos chamam a atenção. Realizou eleições com alto comparecimento, a estimativa é de que a participação atinja 64% dos eleitores, e o vitorioso nestas eleições foi o candidato da centro-esquerda Andrés Manuel López Obrador, projeta-se que vença as eleições com 53% dos votos.

Esta vitória quebra um longo domínio da direita conservadora mexicana. Desde 1929 o PRI vem se sucedendo na presidência, com a exceção dos governos do PAN, igualmente conservador, que governou o país de 2000 a 2011.

O governo de Manuel Obrador, conhecido como AMLO, terá grandes desafios para desenvolver um governo que inflexione a política mexicana no sentido de maior igualdade e inclusão social e política.

Terá que enfrentar a pressão dos Estados Unidos em dois temas chaves, o NAFTA e o tratamento dado aos imigrantes mexicanos. Nesse aspecto, não se pode subestimar o peso que a vizinhança dos EUA soma a, já ofensiva, política imperialista estadunidense sobre o México, em especial.

O controle nacional sobre as reservas petrolíferas também será uma pauta de potencial conflito com os EUA. O Governo atual de Peña Nieto, do PRI, abriu às empresas internacionais a exploração do petróleo. Obrero já se comprometeu, durante as eleições, com a nacionalização dessas reservas.

Desse ponto de vista, o novo governo nasce com uma forte expectativa que retome certa tradição nacional revolucionária, nascida na revolução mexicana de 1911, inicialmente antiliberal e marcada pelo forte componente camponês e popular.

Entretanto, essa equação não será simples, Se a expectativa de que faça um governo nacionalista e popular, como sinalizado com os pactos com as populações originárias e com o campesinato, é imensa, é preciso compreender que será, também, um governo disputado por setores da burguesia, como indica sua aliança com o conservador Partido Encontro Social.

O certo é que Obrero terá um duro enfrentamento, precisará reverter a política neooligárquica e transnacional posta em prática pelos governos do PAN e mantidos pelo governo de Peña Nieto do PRI. Seu programa de governo tentará retomar o caminho do crescimento da economia mexicana, hoje fortemente internacionalizada e marcada pela relação subordinada aos EUA.

Se o fizer, se transformará em uma forte referência para a América Latina. Sua vitória já é uma referência, aliás. Em um processo de forte luta política no continente, a vitória de Obrero demonstra aos setores que resistem à ofensiva autoritária e neoliberal, que as forças reacionárias não são invencíveis.

Há um forte processo de resistência da esquerda e dos setores democráticos no mundo. Sua vitória demonstra que as forças progressistas e de esquerda não foram varridos do continente e que há uma forte barreira de resistência ao neoliberalismo no globo inteiro, como mostram as eleições em Portugal e Espanha na Europa e o Uruguai e o próprio México na América Latina.

Nesta copa do mundo da defesa da democracia e da igualdade, me parece que o povo mexicano se classificou para a próxima fase, com sobras. Na melhor tradição do México de Emiliano Zapata e Frida Kalo.

 

Jorge Branco

Mestre e doutorando em Ciência Política