O inverno está chegando


(Foto: Cristiano Mariz/Revista Veja)

Os ataques de Olavo de Carvalho aos militares seguem uma lógica. O “Astrólogo da Virgínia” mobiliza sua trupe vendendo que eles representam um futuro de rompimento cultural com o passado. Estariam conduzindo o país na direção de um novo paradigma: liberal, conservador e radical.

Para eles, os militares representam um peso e uma ameaça.

Apesar da popularidade, as forças armadas têm a imagem associada à ditadura militar (passado), ao “Brasil Grande” com um Estado interventor e desenvolvimentista.

As falas do general Santos Cruz pedindo moderação e controle nas redes sociais, de Mourão sobre prudência no caso da Venezuela, e de outros militares sobre a necessidade de pacificar o ambiente social, batem de frente com a “cruzada santa de libertação nacional”.

O núcleo ideológico do Bolsonarismo teme o vice-presidente. Se os militares atrapalham a lógica da “guerra santa”, Mourão é a ameaça real que ronda o Planalto.

Mas, se é assim, por que a presença de militares no governo vem aumentando? Dirigir um transatlântico exige equipe. Com quem o Capitão conta? Possui partido? Grupo político?

O presidente tem seus filhos e Guedes como núcleo, mas se apóia nos militares para tentar dar um mínimo de organização ao governo.

Os militares são ingênuos? Claro que não. Conhecem o personagem de longa data. Assumiram o risco de apoiá-lo abertamente de olho no poder. Viram no Capitão o bilhete premiado para a volta triunfal.

Villas Bôas, a maior autoridade intelectual do exército, passou recibo da mistura perigosa. Se o exército não participa do governo como instituição, qual o motivo do general sair na defesa do ministro Santos Cruz?

Ao misturar uma instituição de Estado com política – movido pelo poder e por uma leitura equivocada da luta em curso no país -, o general mais respeitado de sua geração parece ter conduzido a tropa para uma aventura. E na política, toda aventura, cedo ou tarde, cobra seu preço.

A briga no governo expõe também a fragilidade da oposição. Sem inimigos externos, se dão ao luxo de acertar contas internas.

Enquanto o circo pega fogo, o Brasil real afunda. As projeções para o PIB despencaram. O desemprego continua crescendo. A economia está parada, com consumo e produção industrial em queda. O governo apresenta sua solução: o “Santo Graal” da reforma da previdência.

No meio desta confusão, o Centrão vai fazendo seu jogo e assumindo as rédeas no Congresso. A relação deles com Bolsonaro é recíproca: se detestam. Costuram um acordo mínimo por puro instinto de sobrevivência. Por enquanto, um precisa do outro.

O problema deste tipo de relação é que ela não costuma resistir a um inverno rigoroso. Foi o caso de Dilma. Quando a popularidade lhe faltou, acabou abandonada no frio.

O segundo semestre promete. Uma base política inexistente, o Centrão afiando facas, a economia derretendo, uma crise social galopante, um vice de olho na cadeira, o astrólogo enlouquecido e militares preocupados com o risco de serem tragados pelo naufrágio.

O inverno está chegando. Atravessá-lo não será tarefa fácil.

 

Ricardo Cappelli