SOBRE MARIELLE, TODAS E TODOS NÓS
Por: Misiara Oliveira, Secretária de Mulheres PT/RS
Ainda sob a emoção e impacto da execução da vereadora Marielle Franco, do PSOL do Rio de Janeiro, ocorrido na noite de 14 de março, tento digerir e compreender o cenário no qual se insere esta cena tão dolorosa e lancinante, especialmente para as mulheres negras, lésbicas e de periferia, e para nós, mulheres feministas e ativistas dos Direitos Humanos.
Vivemos, há mais de três anos (final de 2014), um processo de Golpe de Estado no País, marcado por um conjunto de retrocessos e, a meu ver, o seu resultado mais grave é a fascistização da sociedade brasileira, associada ao recrudescimento da misoginia e do racismo.
Estamos quase exauridas de tantos lutos, os simbólicos e os reais, os históricos e os que emergem todos os dias nos diferentes recantos desta Pátria desigual chamada Brasil, gentil só para suas elites. Exauridas de ouvir a incompreensão dos que tratam as lutas feministas e anti-racistas como “mi mi mi”. Exauridas por tentar simplesmente apresentar uma ideia de justiça para, pasmem, as maiorias.
Marielle foi executada por seu lugar de fala e de luta, por ousar transgredir a ordem cultural e social estabelecida, por ocupar um lugar que no imaginário nunca deveria ser ocupado por pessoas como ela – a Tribuna!
Este espaço duro, a esfera do poder político no País, onde as mulheres estão absurdamente sub-representadas, e as mulheres negras muito além disso, todos os dias tenta dispensar inúmeras Marielles. Por isso somos sabedoras que chegar onde ela chegou é raro e caro!
Por não suportarmos mais é que no último período temos ampliado nossas vozes e resistências, como na primavera das mulheres, e na linha de frente na defesa de direitos e contra o Golpe.
Há muito tempo não experimentávamos no País uma tão ampla unidade como a alcançada nestes dois últimos 8 de março. Ainda frágil, mas uma semente transformadora e potente.
Neste momento estou acompanhando as redes sociais, há uma grande comoção nacional, enfrentada pelas mais abjetas manifestações de intolerância e violência. Todas estamos sentindo durante estas longas 24h, cada um destes tiros a atravessar nossas mentes, histórias e trajetórias!
É como se uma parte de cada uma de nós, que um dia ousou levantar a voz e se colocou no front das diferentes lutas por justiça e em defesa dos direitos humanos, estivesse partindo junto com o corpo desta Mulher Negra!
Diante disso, podemos afirmar que a execução de Marielle foi política no mais amplo sentido, um crime de ódio, movido com certeza por múltiplos interesses e objetivos muito explícitos: tentar calar a maioria da população brasileira, o conjunto de lutadoras e lutadores sociais, a militância democrática e de esquerda, e mais diretamente a população feminina, negra e pobre!
De tudo isso, penso que se deve gerar uma profunda reflexão sobre nossos espaços e sobre a importância da representatividade!
Hoje não temos como afirmar se as eleições deste ano se realizarão, mas independente disso, não desistiremos e nem deixaremos de empenhar nossas melhores energias na construção de um País democrático, com igualdade racial e de gênero para, enfim, chegarmos ao dia onde teremos muitas Marielles nos representando.
Por fim, por inspiração da Iyá Sandrali Bueno, cito três jovens mulheres negras a quem muito admiro: Laura Sito, Suelen Aires Gonçalves e Sidiliane Pinheiro dos Santos, e em nome delas me dirijo a todas as mulheres negras para lhes dizer: vocês nos inspiram e representam, não desistam, não se calem e nem facilitem o trabalho de quem não as quer em espaços de poder!
Que a mãe Oxum seque nossas lágrimas, que Iemanjá nos dê sabedoria para pensar nas ações futuras e que Oyá nos coloque em pé com a garra necessária para não fraquejarmos nas lutas por Direitos, Democracia, Verdade e Justiça!
Vidas Negras Importam!
Nossas Vidas Importam!
Marielle Presente!