Direitos Humanos para quem?


A Declaração Universal dos Direitos Humanos completou 70 anos nesta semana, dia 10 de dezembro, segunda-feira, para ser mais exata, cinco dias após completar-se cinco anos da morte de Nelson Mandela, Madiba, imortalizado por sua luta por igualdade entre negros e brancos na África do Sul, luta que lhe rendeu 27 anos de prisão. A declaração Universal de Direitos Humanos foi assinada no ano de 1948, ano no qual também se adotava na África do Sul o Apartheid, uma política de segregação social ocorrida na África do Sul entre 1948 e 1994, com a ascensão do Partido Nacional, cujo governo foi composto por uma minoria branca. O país foi governado por esta minoria que adotou desde 1948 uma política de segregação racial. Esse acontecimento foi um dos mais contraditórios em relação aos Direitos Humanos Universais, pois, esse tem como princípio que, “todos seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos” e não era isso o que estava acontecendo na África do Sul.

A colonização da África do Sul teve seu início em 1652 pelos holandeses recebendo influência dos imigrantes das demais partes da Europa e da Ásia. Logo após a chegada dos europeus, a África do Sul foi dominada pela segregação racial onde as ordens emanavam da minoria branca. O Apartheid surgiu em 1944, aderindo a segregação racial que se oficializou com o Novo Partido Nacional no poder em 1948, onde somente os brancos votaram nessa eleição. O Partido Nacional venceu as eleições de 1948 com o slogan “Apartheid”.  O governo de Pretória foi conduzido, então, pelos primeiros-ministros Daniel François Malan (1948- 1954) e, posteriormente, por Johannes Gerhardus Strijdom (1954-1958). Nesse momento, ainda não estava bem claro o que a “separação” poderia significar, mas já poderia ser reconhecida a ideia da separação de grupos específicos de pessoas. O critério pelo qual essas pessoas seriam demarcadas não era racial, pelo menos no sentido formal da palavra. Existia, evidentemente, um tom pejorativo de intenso conteúdo racista dentro do imaginário do Afrikanerdomiv, que foi preservado em toda a sua pureza”.

Com o Apartheid, os negros se submetiam a tal situação de obedecer às ordens emanadas dos brancos porque eram ensinados desde criança a servi-los como seus senhores e também porque foi regulamentado para fixar tal acontecimento como efetivo, certo e que deveria ser seguido. Os direitos que foram restringidos para os negros eram muitos, mais naquela época para não ser considerado uma total abstenção e fazer com que aquilo realmente fosse obedecido, o apartheid veio como lei estabelecendo o que os negros podiam e não podiam fazer, quais direitos e quais deveres que estes tinham etc.

Do ponto de vista político, o apartheid criou uma espécie de aristocracia branca baseada numa rígida hierarquia de castas raciais, para as quais havia uma relação direta entre a cor da pele e as possibilidades de acesso à cidadania e à propriedade”. Ou seja, olhando pelo lado político, o Apartheid passou a existir quando o homem branco além de se denominar superior ao negro tendo esse pensamento como certo, legalizou e passou a diminuir os direitos desses pautados no cumprimento da lei. A visão dos colonizadores brancos era que a cor da pele do negro era motivo para existir uma gama de direitos negados e restringidos, foi caracterizado por medidas como a proibição de casamentos inter-raciais e a circulação de negros em áreas designadas para brancos, além da restrição do sufrágio”.

A diminuição dos negros perante os brancos era imensa e vários exemplos podem ser mencionados como: não frequentar o mesmo local que os brancos e se frequentasse seria por meio de um passe que era uma autorização para se locomover nas ruas e nesse passe continha quais ruas poderiam andar; o casamento entre brancos e negros era completamente vedado; a educação dos negros não era a mesma dos brancos; os negros não tinham o direito ao voto. O regime recebeu duras sanções econômicas e oposição internacional, tendo seu fim definitivo apenas na realização de eleições multirraciais em 1994.

O dia 21 de março de 1960 ficou marcado como uma data trágica pelo ocorrido na África do Sul conhecido como Massacre de Sharperville, repressão violenta e mortal que o regime do apartheid submeteu a um protesto pacífico, realizado naquele bairro de Johanesburgo, de negros sul-africanos, contra a “Lei do Passe”, que limitava seus direitos de ir e vir por meio de documento. Protesto contido à bala de metralhadoras, disparadas pela polícia do regime, com centenas de feridos e mortos. A partir de 1969 aquele 21 de março passou a figurar para a ONU (Organização das Nações Unidas) como um dia de combate e luta contra a discriminação. A África do Sul e o apartheid, daquela década até a libertação de um dos maiores símbolos internacionais da luta antirracista, Nelson Mandela, em 1990, foram alvos de campanhas em diferentes partes do mundo, acionando movimentos pelos direitos civis, por exemplo, nos EUA, na Europa e em nosso país.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada em 10 de dezembro de 1948 pelos Estados-membros da ONU. No contexto político da época, sua adoção expressa a vontade de evitar a repetição de tragédias humanas como as ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial, que havia chegado ao fim apenas três anos antes, em 1945. Porém, ignora todo o passado de violência e tragédias ocorridas em solo Africano. Torna-se o documento mais conhecido e mais influente do mundo na área de direitos humanos. Lista, em 30 artigos, os direitos inerentes (com os quais todo ser humano nasce) e inalienáveis (que não podem ser retirados de ninguém). Ela diz que “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos” e determina que esses princípios devem ser aplicados “sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos tem sido de capital importância para a aplicação desses direitos e a condenação às suas violações. Consolida-se mundialmente a ideia de que o respeito aos seus princípios é um marco civilizatório e condição básica para a construção de um mundo mais justo e igual para todos. Mesmo depois de mais de seis décadas, permanece como um dos mais importantes instrumentos produzidos visando o reconhecimento e a observância dos direitos fundamentais da pessoa humana.

Referências:

https://jus.com.br/artigos/51580/violacao-dos-direitos-humanos-durante-o-apartheid-bem-como-a-importante-participacao-da-onu-para-abolir-tal-sistema

https://www.geledes.org.br/mandela-direitos-humanos-e-a-luta-contra-o-racismo/

https://www.nexojornal.com.br/explicado/2018/12/09/Os-70-anos-da-Declara%C3%A7%C3%A3o-Universal-dos-Direitos-Humanos

https://www.geledes.org.br/apartheid/

https://www.unicamp.br/unicamp/ju/artigos/mario-augusto-medeiros-da-silva/os-direitos-humanos-e-o-dia-internacional-de-luta-pela

Michele Corrêa

Graduanda em Filosofia na UFPel,

Assessora da Pastoral da Juventude (PJ) e

Militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)